quarta-feira, 31 de agosto de 2011

RASCUNHO SELECIONA DEZ "NOVOS" ESCRITORES

A edição de setembro do Jornal Rascunho terá uma reportagem especial sobre a obra de dez romancistas brasileiros que estão começando agora. A edição deve circular na semana que vem, mas os editores anteciparam os nomes pelo twitter.

Especulando um pouco e fazendo pré-avaliações, a seleção me pareceu boa e joga luz em escritores que muitas vezes passam ao largo dos comentários e análises dos blogs e cadernos culturais. Certo, estou exagerando um pouco.

Alguns nomes são um pouco conhecidos, mas todos eles são praticamente "estreantes" na ficção. Bráulio Mantovani já conta com uma sólida carreira como roteirista de cinema; Eliane Brum publicou três livros de reportagens e crônicas; Ronaldo Wrobel publicou três livros, sendo dois romances e um de contos. A maioria também foi finalista ou ganhador de prêmios de literatura em anos recentes.

Abaixo a lista com os escritores que figuram na reportagem:

Braulio Mantovani (1963, São Paulo) - autor de Perácio - relato psicótico que foi publicado pela Leya Brasil. O romance foi finalista do Prêmio SP de Literatura.

Arthur Martins Cecim (1971, Belém do Pará) - autor do romance Habeas asas, sertão do céu! publicado pela Record. O livro foi ganhador do Prêmio Sesc de Literatura 2010.

Karleno Bocarro (1964, Fortaleza) - autor de As almas que se quebram no chão, lançado pela editora É. Muita gente comentou que o livro foi um dos grandes lançamentos do ano passado.

Cezar Tridapalli (1974, Curitiba) - autor de Pequena biografia dos desejos que saiu pela 7Letras.

Ronaldo Wrobel (1968, Rio de Janeiro) - um autor quase "veterano", tendo publicado Raiz quadrada e outras histórias (Bom texto), Propósitos do acaso (Nova Fronteira) e Traduzindo Hannah (Record). Esse último foi finalista do Prêmio SP de Literatura na categoria livro do ano.

Eliane Brum (1966, Ijuí) - autora do romance Uma duas publicado pela Leya Brasil.

LinkMarcelo Cid (1976, ?) - autor do romance Os unicórnios publicado pela 7Letras. Ele também organizou e publicou livros sobre crítica literária. Foi finalista do Prêmio SP de Literatura.

Javier Arancibia Contreras (1976, ?) - autor dos romances Imóbile (7Letras) e O dia em que eu devia ter morrido (Terceiro nome). Ele também foi repórter e publicou um livro-reportagem sobre Plínio Marcos. Imóbile foi finalista do Prêmio SP de Literatura.

Oscar Nakasato (1963, Paraná) - autor do romance Nihonji publicado pela Benvirá.

Gabriela Guimarães Gazzinelli (1982, Belo Horizonte) - autora do romance Prosa de papagaio (Record). Esse último ganhou o Prêmio Sesc de Literatura.

*imagem: reprodução twitter.
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segunda-feira, 29 de agosto de 2011

NOTAS #28



CORTES
William Burroughs, o grande escritor beatnik, lá pelos idos dos anos 60 usou uma técnica chamada 'cut-up' para escrever uma série de romances experimentais (The nova trilogy - se não me engano nunca teve tradução para o português). A técnica nada mais é do que pegar um texto, cortá-lo e reorganizá-lo de maneira aleatória para criar um novo texto. Quem inventou o conceito do 'cut-up' foi o dadaísta Tristan Tzara. Lembra daquela Receita para fazer um poema dadaísta? O vídeo acima mostra o próprio autor explicando o método.

O MELHOR ANO DA FICÇÃO NORTE-AMERICANA
O blog da Publisher Weekly dos Estados Unidos escolheu o ano de 1958 como o melhor para a literatura norte-americana. Quer saber porquê? Naquele ano o ganhador do Pulitzer foi Morte na família, de James Agee; o Nobel de literatura foi para Boris Pasternak graças a seu romance Doutor Jivago; e o National Book Award ficou com As crônicas de Wapshot, de John Cheever. Segundo o blog nesse mesmo ano entre os concorrentes do National Book Award estavam O ajudante, de Bernard Malamud; Pnin, de Vladimir Nabokov; O amor vence tudo, de James Gould Cozzens; e A revolta de atlas, de Ayn Rand.

***

O ano de 1958 também foi o lançamento de O mundo se despedaça, de Chinua Achebe, Bonequinha de luxo, de Truman Capote, Dr. No, de Ian Fleming, Os vagabundos iluminados, de Jack Kerouac e Exodus, de Leon Uris.

COMEÇOS E FINAIS INESQUECÍVEIS
Não tem aquela famosa série sobre 'os melhores começos inesquecíveis' de livros? Pois bem, a revista inglesa Stylist resolveu criar a versão quase definitiva do negócio. Para isso, preparou uma lista com 'os melhores começos inesquecíveis' e também com 'os melhores finais inesquecíveis'. No total são 100 itens para cada uma das categorias. Dos clássicos, aos best sellers contemporâneos tem de tudo um pouco. Mas como toda boa lista é abragente e rende boas discussões.

O SEGUNDO LIVRO
Adam Ross está lançando um novo livro após o enorme sucesso de seu romance de estréia - Mr. Peanut lançado no ano passado. Trata-se de uma coletânea com sete contos chamada Ladies and Gentlemen. Por conta disso tem aparecido várias notinhas envolvendo as leituras preferidas do autor. Numa delas, Ross fala sobre autores que gostou tanto a ponto de ler cronologicamente quase a obra inteira deles: Haruki Murakami, Evan S. Connell, Tobias Wolff, Don DeLillo, Saul Bellow e Italo Calvino são alguns. Noutra nota Ross recomenda alguns livros curtos, para quem não tem tempo, nem paciência de ler livros compridos: Primeiro amor, de Ivan Turgueniev; Um esporte e um passatempo, de James Salter e O castelo de destinos cruzados, de Italo Calvino.

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Em tempo, Mr. Peanut deve sair por aqui em novembro pela Companhia das Letras com tradução de Daniel Pelizzari.

LISTAS
Para finalizar mais duas listas bem curiosas.

Primeiro uma lista meio antiga, mas que sempre vale dar uma olhada: os livros mais roubados nos Estados Unidos. Entre eles: qualquer coisa de Charles Bukowski, William S. Burroughs ou Martin Amis; On the road - pé na estrada, de Jack Kerouac e A trilogia de Nova York, de Paul Auster. Será que temos uma lista dessas para livros aqui do Brasil? Gostaria muito de saber o resultado. Será que Paulo Coelho encabeça a lista?

***

A segunda lista é dos dez livros mais depressivos, segundo o site AbeBooks. Em primeiro lugar ninguém menos que A estrada, de Cormac McCarthy (realmente, a história do pai e do filho tendo de lutar para sobreviver é bem triste!). Depois ainda tem o futuro desesperançoso em 1984, de George Orwell e a saga amarga em As vinhas da ira, de John Steinbeck. A lista completa está disponível aqui.

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sexta-feira, 26 de agosto de 2011

CORTÁZAR EM VERSÃO VIDEO GAME

Eu, você e todos nós somos verdadeiros fãs de Julio Cortázar. O escritor argentino virou a literatura latino americana (e quiça mundial) de cabeça para baixo de maneira bastante original. O que dizer dos contos, dos cronópios, famas e esperanças, dos ensaios sobre literatura e do livro O jogo de amarelinha? Um inovador, certamente.

De modo que fiquei bastante surpreso em saber que só agora fizeram um jogo de videogame inspirado na obra dele. Por que será que demorou tanto? O jogo se chama "Rabbits for my closet" e foi inspirado no conto Carta a uma senhorita em Paris, do livro de contos Bestiário (1951). É a história de um homem que misteriosamente começa a vomitar coelhos. As pequenas criaturas começam a sair o tempo inteiro de sua garganta - tem um momento meio chocante em que ele usa os dedos para puxar um coelho que está preso. Com medo de ser descoberto pela empregada, ele começa a esconder os bichinhos dentro do armário. Só que são muitos e a coisa parece não ter fim. O livro infelizmente está fora de catálogo esperando uma reedição - a última edição foi em 1993 pela Nova Fronteira.

O jogo pega essa atmosfera de tensão. Assumimos o papel do narrador do conto e nossa tarefa é esconder os coelhinhos dentro do armário, antes que a empregada descubra. É bem simples e fácil de jogar. Só achei que poderia ter mais níveis de dificuldade e poderia ter explorado mais o universo do Cortázar.

Quem quiser jogar é só acessar esse link. Para animar a sexta-feira e aproveitar o final de semana. Ah! eu consegui terminar rapidinho, não levei nem dez minutos.

*Imagem: reprodução.
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TRANSMISSÃO: TOM MCCARTHY


Tom McCarthy é um escritor ainda inédito por aqui. Nenhum de seus livros ganhou tradução, seus contos não apareceram em nenhuma revista e ele também não concedeu nenhuma entrevista. Seja como for parece que estamos perdendo senão um grande nome da literatura contemporânea, pelo menos uma pessoa bastante interessada em teorizar sobre romances (ou sobre literatura).

O escritor foi convidado para a edição desse ano do Festival Literário Internacional de Edimburgo - um festival bastante curioso que por conta do verão dura 17 dias e tem muitas atrações. Ele participou de uma mesa intitulada "Noise, signal and word: how writing works" (em tradução livre "Ruído, sinal e palavra: como funciona a escrita") para explicar algumas de suas ideias sobre a figura do autor na literatura.

(Infelizmente o Festival não tem transmissão online das mesas e também não guardou nenhum arquivo em vídeo dessa apresentação. O que eu sei li na cobertura do jornal Guardian. Foi de lá que tirei um resumo das coisas que Tom McCarthy falou nessa mesa.)

Pegando carona nos temas que estão no romance C (um romance ambientado em pleno começo do século XX quando os grandes meios de comunicação sem fio estavam sendo inventados), Tom McCarthy propôs ideias para demonstrar que a literatura não tem autor. Para ele, escrever não é um ato de auto-expressão, nem uma maneira de compartilhar nossos sentimentos. A escrita é apenas transmissão da linguagem que fala por nós. Assim, os livros nada mais são do que "câmaras de eco" (lugares em que ecoam a linguagem que nos ronda). Consequentemente, os melhores livros são aqueles que conseguem sintonizar a linguagem e os pensamentos que estão espalhados por ai.

Para ilustrar essa apresentação, McCarthy falou sobre o mito de Orfeu em Ovídio, Rainer Maria Rilke e mostrou um trecho do filme Orfeu, de Jean Cocteau (1949). Nesse filme, Orfeu vive as voltas com um rádio de carro que sintoniza sempre vozes transmitidas por um poeta do além. São mensagens cifradas que lembram códigos. McCarthy também mostrou a música Antenna, da banda Kraftwerk. Ela está no disco Radio-Activity (1975) repleto de temas ligados a rádios, energia nuclear, ondas sonoras, transmissões e antenas. A letra minimalista de Antenna diz o seguinte: "I'm the antenna catching vibration/ You're the transmitter give information/ I'm the transmitter I give information / You're the antenna catching vibration".

Não é a primeira vez que essas ideias circulam no meio literário. Nos anos 50 os estruturalistas franceses já falavam disso - Roland Barthes foi um dos primeiros a teorizar sobre a morte do autor. Toda a turma do Nouveau Roman (Alain Robbe Grillet, Nathalie Sarraute, Michel Butor, Marguerite Duras, Claude Simon) construiu sua obra a partir desse caminho. O pessoal do OuLiPo também. No entanto não deixa de ser interessante o fato de um escritor do nosso tempo voltar a essas ideias para usá-las como tema de seu processo de escrita - não digo como forma, já que ele não está experimentando com a linguagem, nem apagando categorias narrativas. É como se McCarthy esteve se esforçando para chamar nossa atenção ao retorno natural que o romance e a literatura podem tomar - fazer da inovação uma tradição e recuperar isso tudo com um novo olhar. Dessa forma, quem sabe, a gente não pode encontrar uma solução para a angústia de ter de sempre superar o que esteve atrás de nós.

Em tempo, Tom McCarthy já está trabalhando num novo romance que vai ser sobre poluição e meio ambiente. Quem quiser ler os romances já publicados por ele, pode recorrer a tradução portuguesa ou encarar as edições inglesas - diretamente do original.

*imagem: reprodução daqui.


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segunda-feira, 22 de agosto de 2011

AS CIDADES VISÍVEIS

Acho Italo Calvino um escritor seminal. Ele criou uma teoria inovadora para resolver um impasse que consumia os escritores do século passado: como o romance poderia encontrar um novo caminho diante de tantas inovações formais (Marcel Proust, James Joyce, William Faulkner, Virginia Woolf etc)? A saída que ele encontrou pensava no futuro ao mesmo tempo que olhava para o passado. Unia progresso e restauração - para usar uma imagem consagrada naquele ensaio Filosofia da nova música, de Theodor Adorno (I).

Calvino privilegiava o leitor preservando a história (a fábula, o enredo, a trama, o plot) - não foi à toa que organizou um volume de Fábulas italianas e escreveu Por que ler os clássicos? Ele não promovia "exercícios puros de linguagem", mas brincava de todas as maneiras com a forma (a estrutura narrativa). Aqui estou pensando no Calvino das Cosmocômicas, O castelo dos destinos cruzados, Os amores difíceis, As cidades invisíveis, Se um viajante numa noite de inverno e Palomar.

[Tem um post do ano passado no Todoprosa que quando eu li pensei imediatamente no Calvino - O gosto de contar. Foi de lá que retirei algumas das ideias do parágrafo anterior.]

A gente embarca naquele mundo fantástico, vai reconhecendo os temas, as personagens e as alegorias. Vamos em busca da história do visconde que leva uma bala no peito e se divide em dois, o barão que se revolta e sobe as árvores e do cavaleiro que não existe. Às vezes até viramos personagem do livro que estamos lendo (somos o leitor de Se um viajante...). E como Kublai Khan, nos encantamos com as história de Marco Polo e as cidades que ele visita.

Deve ter sido esse mesmo fascínio que rondou a cabeça da artista plástica Nora Sturges. Um amigo dela recomendou a leitura de As cidades invisíveis depois que ela fez algumas pinturas sobre as viagens de Marco Polo. Ela gostou tanto do livro que criou pinturas para algumas cidades. O trabalho final ficou bem interessante. Encontrei as imagens enquanto pesquisa coisas sobre Calvino - acho que a notícia nem é tão recente, mas não resisti.

O trabalho todo pode ser visto aqui.





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(I) Não estou usando essa imagem para demonstrar erudição. Nem quero comparar "alhos com bugalhos"! É que As cidades invisíveis foi tema de uma monografia que escrevi para conclusão de um curso de especialização. Naquela época, enquanto fazia as pesquisas teóricas, sempre me vinha a cabeça a imagem desse ensaio do Adorno. As palavras restauração e progresso parecem se encaixar como uma luva para as coisas (ficção e crítica) que Italo Calvino escreveu.

*Imagens: reprodução do site de Nora Sturges.
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sexta-feira, 19 de agosto de 2011

FILBA 2011

Em setembro Buenos Aires vai pegar fogo com o FILBA - Festival internacional de literatura en Buenos Aires - um festival literário bem aos moldes da nossa FLIP. Será sua terceira edição. Além dos argentinos, que constituem a maior parte dos convidados, há escritores da Espanha, México, Chile, África do Sul, Japão, Holanda, Dinamarca, Noruega, Canadá, Itália, País de Gales e Brasil.

Dentro da programação nossos hermanos dedicaram um bloco inteiro ao nosso país com participação de Vilma Arêas, Adriana Lisboa, Santiago Nazarian, Joâo Gilberto Noll, Joca Reiners Terron, Luiz Ruffato e Moreno Veloso (ele não é exatamente escritor, mas vai participar de um painel sobre a cultura brasileira contemporânea e de uma performance com poemas cantados). Uma singela homenagem a nossa literatura no momento em que todo mundo fala bastante sobre projeção internacional.

No total serão cinco mesas literárias com nossos escritores (não inclui nessa conta o painel sobre cultura brasileira conteporânea e a performance do Moreno Veloso): uma entitulada "Palabras cruzadas: lecturas - leituras" com Joâo Gilberto Noll, Vilma Arêas e Adriana Astutti; uma homenagem a Machado de Assis e Guimarães Rosa com Vilma Arêas, Santiago Nazarian, Adriana Lisboa e Florencia Garramuño; uma mesa dedicada a Joâo Gilberto Noll; outra chamada "Literaturas lusoparlantes: ¿Islas lingüísticas?" com Luiz Ruffato, Joca Reiners Terron e Adriana Lisboa e por último uma homenagem a Clarice Lispector com Vilma Arêas, Luiz Ruffato e Florencia Abbate.

***

Penso aqui com meus botões que as estrelas veteranas serão Cees Nooteboom e J.M. Coetzee. Eles já estiveram na FLIP - o primeiro em 2007 e o outro no ano seguinte. O último livro publicado por Nooteboom foi uma coletânea de contos chamada ’s Nachts komen de vossen (em holandês). Não consegui descobrir se esse livro ganhou tradução para outras línguas. J.M. Coetzee vem de uma temporada de sucesso estrondoso com a publicação de Verão, livro que conclui a trilogia Cenas da vida na província.

***

Bem que a gente poderia aproveitar a presença do J.M. Coetzee na América do Sul e convidá-lo para uma passagem pelo Brasil, né? Seria mais ou menos a mesma coisa que acontece com os shows internacionais: vem pra Argentina e em seguida pra cá. Poderíamos quem sabe fazer uma parceria com nossos hermanos, o que vem pra cá vai pra lá e vice-versa.

*imagem: filba.org.ar
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quinta-feira, 18 de agosto de 2011

FRANZEN E O URSINHO PUFF

Ontem, Jonathan Franzen fez aniversário. Para a data não passar em branco o PEN American Center disponibilizou em seu podcast uma palestra de Franzen sobre o tema "O que deu errado?". Detalhe: a apresentação foi feita por Salman Rushdie. O áudio está disponível nesse link.

***

Outro que está fazendo aniversário é o Ursinho Puff. Para celebrar os 90 anos do ursinho mais amado do mundo, resgatei dos arquivos do blog um post com uma história surreal: Puff vs. Alien. Tudo no melhor estilo mashup literário sci-fi.

*Imagem: Jonathan Franzen / www.pen.org
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O ENFANT TERRIBLE DA CALIFÓRNIA ESTÁ DE VOLTA!

Bret Easton Ellis, o enfant terrible mais amado e odiado da literatura norte-americana, está de volta com um novo romance, Suítes imperiais (publicado pela editora Rocco com tradução de Ryta Vinagre).

O autor resgatou as personagens de seu romance de estréia, Abaixo de zero, para mostrar que ele não estava exagerando quando escreveu aquela história de degradação adolescente na Los Angeles dos anos 80. Muito daquilo virou realidade. Parece que em Suítes imperiais, Clay, Julian, Blair, Rip e Trent estão mais velhos e são pessoas bem-sucedidas. Ao contrário do que a gente pode imaginar, eles não estão mergulhados em reflexões sobre ficar mais velho. Todos continuam sua jornada pelo mundo do consumismo, das drogas, do sexo e da violência em doses industriais. É como se desde os anos 80 as coisas só tenham piorado e o futuro certamente será ainda mais violento e sombrio.

Como bem apontou o escritor Antônio Xerxenesky numa resenha para o Jornal do Brasil: "A produção de Ellis é irregular, acidentada, mas também variada e curiosa, não apenas por um “possível retrato da sociedade”, mas pela habilidade nas experimentações formais do autor". Ellis experimentou o hiperrealismo narrativo, o fluxo de consciência, fez sátira de humor ácido, usou e abusou da autoficção e tocou em temas que eram verdadeiros tabus para a sociedade americana. Não é qualquer escritor que passeia por um leque tão variado de formatos.

(Aqui cabe um parêntese: Bret Easton Ellis fez falta na segunda edição do fanzine. De uma maneira ou de outra a maioria dos assuntos desse segundo número giravam em torno da autoficção. Ellis não apareceu, mas esteve presente na narrativa dos jovens franceses Pierric Bailly, Lolita Pille e Sacha Sperling. A influência dele sobre eles me parece bastante nítida. Assim como William Burroughs, J.D. Salinger, Michel Houellebecq e outros mais).

Para promover o livro nos Estados Unidos a editora de lá preparou um trailer cinematográfico - com direito a trilha sonora de Radiohead. Além disso, eles prepararam uma playlist na internet para você ouvir enquanto lê o romance - dá até para ouvir playlists sugeridas para outros romances do autor. Para Suítes imperiais tem Elvis Costello, Duran Duran, The National, Bruce Sprinsteen, Counting Crows, David Bowie etc. Para ouvir a playlist é só clicar aqui. O trailer do livro está logo abaixo:



Não contente, a editora ainda convidou a produtor It's alive animation para criar um curta de animação baseado em Suítes imperiais. A animação ficou a cargo de Sascha Ciezata.



N momento, Bret Easton Ellis está trabalhando com Paul Schrader num filme de terror sobre tubarões. Parece que o filme vai se chamar "Bait", com direção de Paul Schrader e roteiro dele. Deve ficar pronto no ano que vem.

Outra notícia super bacana: simultaneamente ao lançamento de Suítes imperiais pela Rocco, a L&PM prepara a reedição, em formato pocket, de Abaixo de zero e Psicopata americano. Abaixo há um trecho de Suítes imperiais, gentilmente cedido pela editora Rocco:


*imagem: divulgação.

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segunda-feira, 15 de agosto de 2011

LENDO: PONTO ÔMEGA, DE DON DELILLO

Comecei a ler na semana passada o último livro lançado por Don DeLillo, Ponto ômega - saiu por aqui pela Companhia das Letras com tradução de Paulo Henriques Britto. Daí você deve estar se perguntando: "mas o que tem a ver essa foto com o livro"? É que o livro faz uma referência a obra de arte 24 Hour Psycho (1993), de Douglas Gordon. O artista plástico expandiu a duração do filme Psicose, de Alfred Hitchcock para que ele tivesse duração de 24 horas.

A novela de DeLillo começa e termina com pessoas dentro do MoMA visitando essa obra de arte. Entre essas duas parte se desenrola o enredo.

É uma novela curta (tem apenas 104 páginas), mas de grande impacto por conta da linguagem direta, da economia narrativa e do enredo sinistro - essas são minhas impressões até o momento. Na edição nº 02 do fanzine há uma bela resenha de Lance Olsen e um trecho da primeira parte do livro (gentilmente cedido pela Cia das Letras). Quem se interessar pode fazer o download do fanzine aqui.

*imagem: reprodução do Guardian.

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sexta-feira, 12 de agosto de 2011

FRAGMENTOS DE "OS MIL OUTONOS DE JACOB DE ZOET"

Daniel Galera postou no tumblr dele mais alguns trechos da tradução que está fazendo para The thousand autumns of Jacob de Zoet, de David Mitchell - em português deve ficar com o título Os mil outonos de Jacob de Zoet. A Companhia das Letras tinha previsão de lançar o livro nesse semestre, mas acabou ficando para o ano que vem. Enquanto isso, a gente pode matar a curiosidade com esses trechos:

"Da torre da igreja de Domburg, Jacob viu muitas ventanias chegarem a galope da Escandinávia, mas um tufão oriental tem algo de senciente e ameaçador. A luz do dia é violentada; a floresta se debate no crepúsculo prematuro das montanhas; a baía negra enlouquece com as ondas agitadas; golfadas de espuma do mar borrifam os telhados de Dejima; a madeira range e suspira. Os marujos do Shenandoah estão descendo a terceira âncora; o primeiro imediato dá berros inaudíveis no tombadilho. Para o leste, os comerciantes chineses e a equipagem fazem o que podem para proteger o que possuem. O palanquim do intérprete atravessa a Praça Edo vazia; a fileira de plátanos balança e chicoteia; não se vê nenhum pássaro voando; os barcos dos pescadores vão sendo arrastados até a margem e açoitados em grupo. Nagasaki está se recolhendo para uma noite das piores.”

"Ao se barbear, o homem relê sua mais fiel autobiografia.”

“Gaivotas voam em rodas raiadas de sol sobre telhados luzidios e palha desalinhada, fisgando tripas na feira e escapando por cima de jardins cercados, muros cobertos por lanças e portas de triplo cadeado. Gaivotas pousam nos frontões caiados, nos pagodes cheios de rangidos e estábulos cheios de esterco; circulam sobre torres e sinos cavernosos e sobre praças escondidas em que vasos de urina descansam ao lado de poços tampados, observadas pelos tocadores de mula e pelos cachorros com focinho de lobo, ignoradas pelos tamanqueiros corcundas; sobem pelo pedregoso Rio Nakashima ganhando velocidade e passam por baixo dos arcos de suas pontes enquanto são avistadas das portas das cozinhas e acompanhadas pelos fazendeiros que andam nas cristas elevadas e rochosas. Gaivotas furam as nuvens de vapor que saem dos tachos das lavanderias; sobrevoam milhafres desfiando cadáveres felinos; estudiosos vislumbrando a verdade em padrões ínfimos; adúlteros nas casas de banho; rameiras de coração partido; megeras desmembrando lagostas e caranguejos; seus maridos limpando cavalas nas lajes; filhos de lenhadores amolando machados; fabricantes de velas derramando ceras; oficiais de olhar ferino espremendo taxas; laqueadores estiolados; tintureiros de pele pintada; gente dizendo meias-verdades para acalmar; mentirosos mentindo sem piscar; tecedores de tatames; cortadores de junco; caligrafistas de lábios manchados molhando pincéis; livreiros arruinados por livros encalhados; damas de companhia; provadores; camareiros ; pájens roubando; cozinheiros com o nariz escorrendo; cantinhos escuros de sótãos em que costureiras fuçam nos calos dos dedos; trabalhadores fingindo doença; porqueiros; caloteiros; devedores mascando os lábios e esbanjando desculpas; credores que já ouviram tudo apertando o cerco; prisioneiros assombrados por vidas mais felizes e velhos devassos com a mulher dos outros; professores esquálidos provocados a dar broncas; bombeiros agindo como saqueadores de ocasião; testemunhas caladas; juízes comprados; sogras cultivando roseiras-bravas e rancores; droguistas amassando pilões; palanquins levando filhas que ainda não casaram; freiras taciturnas; putas de nove anos de idade; as outrora belas e hoje carcomidas; estátuas de Jizo sendo ungidas com ramalhetes; sifilíticos espirrando por narizes apodrecidos; ceramistas; barbeiros; mascates de óleo; curtidores; cuteleiros; carroceiros de excrementos; porteiros; apicultores; ferreiros e cortineiros; torturadores; amas de leite; abjuradores; batedores de carteira; os recém-nascidos; os que crescem; os firmes e os dóceis; os enfermos; os moribundos; os fracos e os inconformados; por cima do telhado de um pintor que se afastou primeiro do mundo, depois da família, para mergulhar numa obra-prima que se afastou de seu criador; até voltar ao mesmo lugar, até onde o voo teve início, sobre a varanda da Sala do Último Crisântemo, onde uma poça de chuva da noite passada está evaporando; uma poça na qual o Magistrado Shiroyama observa os reflexos borrados de gaivotas voando em rodas raiadas de sol. Esse mundo, ele pensa, abriga uma única obra-prima, que é ele próprio.”

“A verdade de um mito… não está nas palavras, e sim nos padrões.”

“Antes da chamada noturna, Jacob sobe na Torre de Vigia e tira o caqui do bolso do casaco. Os dedos de Aibagawa Orito deixaram marcas na fruta madura e ele encaixa nelas os próprios dedos, aproxima o presente das narinas, aspira sua doçura abrasiva e rola a sua redondeza sobre os lábios rachados. Me arrependo da minha confissão, pensa, mas que escolha eu tinha? Ele eclipsa o sol com o caqui: o planeta brilha alaranjado como uma lanterna de abóbora. Há uma espécie de poeira ao redor do chapéu e do caule pretos. Sem faca ou colher à mão, ele prende uma pontinha da casca cerosa nos indicadores e a rasga; o suco escorre pelo corte; ele lambe os pingos adocicados, suga fora um naco gotejante de carne filamentosa e o prende suavemente, suavemente, contra o céu da boca, onde a polpa se desintegra em jasmim fermentado, canela oleosa, melão perfumado, ameixas derretidas… e no coração da fruta ele encontra dez ou quinze pedras chatas, da mesma cor marrom e formato dos olhos asiáticos. O sol se foi agora, as cigarras calam, lilases e turquesas turvam e se diluem em cinzas sucedidos por cinzas ainda mais escuros. Um morcego passa a poucos metros, perseguido por sua própria turbulência felpuda. Não há o mais tênue sopro de vento. A fumaça sobe da chaminé da cozinha do Shenandoah e vai se desmanchando em torno da proa do brigue. As portinholas estão abertas e a água carrega o som de dez dúzias de marujos jantando no seu ventre; e como um diapasão posto a vibrar, Jacob reverbera com as partes e com o todo de Orito, com tudo que faz com que ela seja ela. A promessa feita a Anna arranha sua consciência como um esmeril, Mas Anna, ele pensa com desconforto, está muito afastada em milhas e anos; e ela me deu o seu consentimento, ela praticamente me deu o seu consentimento, e além disso ela jamais ficaria sabendo, e o estômago de Jacob ingere o presente escorregadio de Orito. A Criação não terminou na sexta noite, ocorre ao jovem. A Criação se desdobra ao redor de nós, apesar de nós e através de nós, na velocidade dos dias e das noites, e gostamos de chamá-la de Amor.”

David Mitchell, Os mil outonos de Jacob de Zoet via Daniel Galera.

*Imagem: hoita/reprodução do flickr.
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quinta-feira, 11 de agosto de 2011

WELLS TOWER - TUDO DESTRUÍDO, TUDO QUEIMADO

Wells Tower parece um sujeito bastante determinado. Para conseguir o primeiro emprego de sua carreira como jornalista, ele ficou dias tentando convencer um editor da revista do Washington Post a lhe dar um artigo sobre a vida como trabalhador do carnaval americano. O emprego durou pouco, mas lhe rendeu experiência para escrever artigos incomuns em outros jornais e revistas.

Ele só começou a escrever ficção quando ingressou num curso na Universidade de Columbia. Publicando um pouco aqui e ali em algumas revistas, ele esperou sete anos até finalmente lançar seu primeiro livro de contos chamado Tudo destruído, tudo queimado. A espera foi recompensada com uns tantos prêmios de crítica que o livro ganhou, com as duas resenhas no New York Times (uma de Edmund White e outra de Michiko Kakutani) e com a nomeação para a seleção de jovens escritores da revista New Yorker.

Curioso é saber que quando Tower era adolescente, ele e um amigo criaram um fanzine sobre música hardcore. Na hora de escrever os textos eles falavam de tudo o que dava na telha, menos de música. É dessa época também que vem seu gosto pela leitura de John Cheever, Raymond Carver, Richard Yates e mais recentemente Lydia Davis, Geoff Dyer, David Mitchell e outros tantos mais. A maioria desses autores circula livremente no terreno da ficção e não-ficção.

O livro está ganhando uma edição em português pela editora Rocco com tradução da escritora Adriana Lisboa. O livro tem nove contos e a editora Rocco, gentilmente, adiantou o conto "Leopardo". Esse conto foi publicado pela primeira vez em 2008 na revista New Yorker. É uma história triste e ao mesmo tempo hilária de um garoto que está com uma ferida perto dos lábios e inventa mil desculpas para não ir a escola. Assim aparece a figura do padrasto incrédulo, um policial inexperiente e um susposto leopardo que está perdido na vizinhança.


*Imagem: divulgação.


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quarta-feira, 10 de agosto de 2011

RICARDO PIGLIA DE VOLTA COM ALVO NOTURNO

Chega essa semana às livrarias Alvo noturno, de Ricardo Piglia - pela Companhia das Letras. O escritor finalmente quebra o jejum de mais de dez anos sem publicar ficção (seu último romance foi Dinheiro queimado - escrito em 1997) e parece que ele venceu uma espécie de bloqueio criativo. O esforço valeu a pena, pois o livro foi muito bem recebido pela crítica internacional e até recebeu o Prêmio Rómulo Gallegos.

A revista Época dessa semana tem uma reportagem sobre o romance com direito a entrevista com o autor (infelizmente só disponível para assinantes da revista). Piglia fala sobre seus "transtornos" criativos, a demora para escrever, seu processo de trabalhos e o medo de ter perdido seu talento. Ainda diz que está inspirado pela nova geração de autores de Buenos Aires e que prepara um próximo livro de contos com título provisório de Histórias personales.

Bem-vindo de volta, Piglia! Tem um trecho de Alvo noturno disponível aqui.

*imagem: divulgação.
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terça-feira, 9 de agosto de 2011

A PLAYLIST DE THOMAS PYNCHON

Quem diria que Thomas Pynchon, o escritor mais cultuado e recluso do mundo, poderia algum dia atacar de "dj"? Pelo menos é o que está escrito na página de Vício Inerente no site da Amazon.com. Até onde sei essa notícia está rolando desde o ano passado, mas foi só agora que topei com ela. Na internet circulam outras playlists com até 300 faixas, vai saber.

A playlist "oficialmente" organizada por Mr. Pynchon tem 42 faixas e inclui Beatles, Rolling Stones, Beach Boys, Pink Floyd, Stan Getz & Astrud Gilberto e outras bandas mais. A seleção é tão boa que a gente poderia tranquilamente fazer uma festa inteira com ela. Alguém se anima a organizar?

Na página da Amazon tem o seguinte texto falando sobre a playlist:
Larry "Doc" Sportello é um detetive particular que vê o mundo através de uma névoa pegajosa de droga, animado pela música de uma época cujas marcas registradas eram paz, amor e revolução. Enquanto o estranho caso de Doc cresce estranhamente, sua trilha sonora dos anos 60 - que varia de surf, pop e rock psicodélico a instrumentais misteriosos - pega o ritmo. Ouça algumas das músicas que você vai escutar em Vício inerente - a playlist que se segue foi feito exclusivamente para Amazon.com, por cortesia de Thomas Pynchon.
As faixas são:

Bamboo - Johnny and the Hurricanes
Bang Bang - The Bonzo Dog Band
Bootleg Tape - Elephant's Memory
Can't Buy Me Love - The Beatles
Desafinado - Stan Getz & Astrud Gilberto, with Charlie Byrd
Elusive Butterfly - Bob Lind
Fly Me to the Moon - Frank Sinatra
Full Moon in Pisces - Lark
God Only Knows - The Beach Boys
The Greatest Hits of Tommy James and The Shondells

Happy Trails to You - Roy Rogers
Help Me, Rhonda - The Beach Boys
Here Come the Hodads - The Marketts
The Ice Caps - Tiny Tim
Interstellar Overdrive - Pink Floyd
It Never Entered My Mind - Andrea Marcovicci
Just the Lasagna (Semi-Bossa Nova) - Carmine & the Cal-Zones
Long Trip Out - Spotted Dick
Motion by the Ocean - The Boards
People Are Strange (When You're a Stranger) - The Doors
Pipeline - The Chantays
Quentin's Theme (Theme Song from "Dark Shadows") - Charles Randolph Grean Sounde
Rembetissa - Roza Eskenazi
Repossess Man - Droolin’ Floyd Womack
Skyful of Hearts - Larry "Doc" Sportello
Something Happened to Me Yesterday - The Rolling Stones
Something in the Air - Thunderclap Newman
Soul Gidget - Meatball Flag
Stranger in Love - The Spaniels
Sugar Sugar - The Archies
Super Market - Fapardokly
Surfin' Bird - The Trashmen
Telstar - The Tornados
Tequila - The Champs

Theme Song from The Big Valley - Beer
There's No Business Like Show Business - Ethel Merman
Vincebus Eruptum - Blue Cheer
Volare - Domenico Modugno
Wabash Cannonball - Roy Acuff & His Crazy Tennesseans
Wipeout - The Surfaris
Wouldn't It Be Nice - The Beach Boys
Yummy Yummy Yummy - Ohio Express


Vício inerente foi o último romance escrito por Pynchon e foi lançado em agosto de 2009 nos Estados Unidos. Também saiu por aqui em novembro do ano passado pela Companhia das Letras. Tem um trecho do romance disponível aqui.

O livro conta a história de um "detetive particular chamado Doc Sportello (...) que é contratado por uma ex-namorada para investigar o sumiço de um poderoso barão do mercado imobiliário". Tudo se passa na Califórnia dos anos 70 em pleno declínio da contracultura "flower power". Tem Charles Manson, tem hippies, surfistas, traficantes, contrabandistas, bandas de rock, prostitutas e muitas drogas. Lembro que até rolou um vídeo promocional com dublagem do próprio Thomas Pynchon.

O livro ainda pode virar filme pelas mãos do diretor Paul Thomas Anderson.

*imagem: reprodução Google imagem / capa - divulgação.
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segunda-feira, 8 de agosto de 2011

UMA CONVERSA COM PAUL HARDING

Por Tony Perez

A restauração das horas, de Paul Harding é um dos meus romances favoritos dos últimos dois anos (eu adoro quando o comitê do Pulitzer acerta), por isso, quando surgiu a oportunidade de entrevistá-lo para o Portland Mercury há alguns meses, eu aceitei na hora. Acho que ainda não dominei esse negócio da pergunta precisa para as respostas concisas (ou não poderia ajudar, mas somente sentar e ouvir alguém falar brilhantemente sobre a teologia da reforma protestante e da mecânica quântica... e como elas se relacionam com a ficção) porque o que era para ser uma entrevista de 550 palavras acabou ficando em cerca de 5000. Nem preciso dizer que eu tive de fazer um corte significativo. Felizmente, a internet não conhece o tamanho de uma coluna. Abaixo está a versão do editor para a entrevista.

Tony Perez: Pelo que ouvi, você recebeu um monte de cartas de rejeição antes da editora Bellevue concordar em publicar A restauração das horas. Agora que você já tem um Pulitzer e um prêmio PEN, existe alguém em especial para quem você gostaria de dizer "eu avisei"?

Paul Harding: Não. Eu tenho pessoas em mente e acho que elas sabem quem são. Pessoalmente, é muito frustrante ser rejeitado desse jeito; você trabalha aos poucos em seu romance, suas histórias, seus poemas e depois você encontra esse tipo de apatia do mundo editorial. Mas isso é muito comum para escritores. Eu olho para isso como o meu lugar nesse tipo de negócio. Autores de contos em especial... eles têm de manter planilhas do Excel com as revistas e as cartas de rejeição. Há todas estas histórias de pessoas decorando seus estudos com cartas de rejeição, então eu acho que eu só tenho a minha parte do lote de escritor.

TP: A restauração das horas não tomou o caminho típico rumo ao sucesso. Foi publicado por uma editora pequena e, pelo menos inicialmente, voou baixo sob o radar da maioria dos grandes meios de comunicação. Parece que o livro realmente decolou através do boca-a-boca. Você pode falar sobre o ímpeto do livro e quando você percebeu que os leitores foram se ligando nele?

PH: Sim. A Bellevue Literary Press fica no hospital Bellevue – o infame hospital Bellevue – e é atualmente um selo sem fins lucrativos que é publicado pela escola de Medicina da Universidade de Nova York. Então essa é a minha editora: a escola de Medicina da Universidade de Nova York. Como um editor de lá falou, o adiantamento foi simbólico. Eles não têm um orçamento de marketing ou qualquer coisa. Mas, felizmente, fizeram algumas primeiras cópias e havia, em particular, uma representante de vendas chamada Lise Salomon em São Francisco que leu o livro e o colocou debaixo do braço – tornou-se uma advogada dele, falando bastante antes da publicação. Ela meio que sente um burburinho acontecendo na costa oeste antes de qualquer coisa acontecer aqui. Mas o boca-a-boca começou um pouco antes da publicação – a Publisher’s Weekly deu uma boa resenha sobre ele. Tão logo as primeiras cópias saíram ficou visível o fato de que existe realmente uma livraria independente, vendendo de mão em mão, uma rede boca-a-boca de leitores apaixonados. O que é tão gratificante para mim sobre isso tudo é que ainda existem essas redes. Se você publicar um livro, mesmo através de uma pequena editora, ele pode encontrar seus leitores.

Foi na lista dos mais vendidos em São Francisco bem quando ele permaneceu por umas duas semanas. Eu fui lá e fiz algumas turnês, em seguida voltei para a costa leste e foi como se o livro nunca tivesse sido publicado. Mas paralelamente o livro continuou seguindo, o que pensávamos ser um bom sinal – não era só um pico de vendas inicial devido a uma campanha de marketing ou qualquer coisa assim. Meio que manteve a venda. Foi resenhado em um monte de grandes jornais da cidade, a New Yorker fez uma resenha, mas o New York Times não. Chamou a atenção das pessoas a maneira como o livro foi sendo trabalhado. Assim, bem antes do Pulitzer, sentimos como se fosse um sucesso. Estava recebendo opiniões respeitáveis ​​em todo o país e estava vendendo cada vez mais – eu pensei que aquilo era fantástico e muito mais do que eu jamais imaginei que iria acontecer. Três ou quatro semanas antes do Pulitzer ser anunciado, eu soube que eu tinha recebido um prêmio Guggenheim. Achei que aquela era a cereja do bolo. Então aconteceu o Pulitzer, e o PEN, do tipo efeito bola de neve. Para mim, novamente, assim que havia cinquenta exemplares impressos, era tudo esse tempero de São Francisco. O fato de ter sido tão difícil de publicar, eu estava mais ou menos me reconciliando a não conseguir publicá-lo, apenas fazer arte pela arte. Então, tudo posterior a isso, realmente, era só esse mesmo tempero.

TP: Como alguém que trabalha para uma pequena editora, sou encorajado a ver essas coisas acontecerem. Editoras independentes de todo o país ficaram felizes em ver a shortlist do Pulitzer sair, não apenas com A restauração das horas, mas com a coletânea de contos de Lydia Millet da editora Soft Skull [Love in Infant Monkeys].

PH: Com certeza, como viajei por aí, é tão surreal ser o protagonista neste tipo de coisa não-consigo-ser-publicado-para-o-Pulitzer. Mas para mim, o aspecto mais importante disso, o aspecto realista disso, é apenas aquela ideia de que há lugares lá fora, editoras independentes, que ainda podem publicar seus livros para as pessoas que querem encontrá-los. E com coisas como o Pulitzer, não existe correção. Editoras pequenas anunciaram que querem participar dessa competição. Nem todo mundo é um grande, um gigante rolo compressor corporativo. Parece, também, pela minha experiência, que editoras independentes estão onde a lista de autores medianos estão hoje em dia. O que é legal. Talvez você tenha que complementar a sua renda com o ensino ou o que quer seja, mas ainda é uma opção viável para ser um artista.

TP: Eu estou muito interessado na estrutura de A restauração das horas. É alucinante, e como tal, não está em dívida num cronograma rigoroso ou ponto de vista dos eventos. Como George se encontra em seu leito de morte, temos momentos dispersos, não só da sua vida, mas também das vidas de seu pai e avô. A estrutura foi algo que você impôs sobre o texto desde o início, ou só mais tarde se tornou clara?

PH: Foi um pouco das duas coisas. Parte disso vem da maneira como eu escrevo ficção. Eu faço as coisas tipo como colagem; eu escrevo pequenas passagens secundárias – conjuntos. Acho que quando escrevo ficção a coisa não vem completamente em episódios, mas em instantes. O instante em que Howard percebe que está deixando sua família. O instante em que George percebe que ele vai morrer. Eu passo muito tempo expandindo esses momentos. Sabe quando você compra um cortador de grama, olha para o manual de instruções e tem aqueles desenhos separados: as porcas, parafusos e pequenas partes das rodas. Isso é basicamente o que eu faço. Eu só expando esses momentos, analiso e olho para a personagem.

Mas também, em certa medida, o assunto se prestou a uma arquitetura associativa e não linear. Não só por causa da alucinação e desilusão de sua consciência, mas também porque muito do romance é interior – eu pensei nisso como se movimentar por associação, como a mente faz. Quando olhamos em pensamento para a vida que vivemos, ela não é linear. Nós a organizamos em padrões lineares, porque todos nós temos que colocar os sapatos e depois ir trabalhar, mas sua mente se move muito por associação. Então, o assunto e o meu método de escrita de alguma forma complementam um ao outro.

TP: Eu não costumo dar muita bola para o falatório antes do lançamento de um livro, mas Elizabeth McCracken [crítica americana] escreveu algo que realmente me marcou. Ela chamou o livro de um "manual de instruções sobre a maneira de olhar para quase tudo". Você parece obcecado com os mínimos detalhes – seja paisagem, animais, relógios ou um vendedor ambulante – e suas descrições seguem mais para a linguagem poética do que nós costumamos ver num monte de textos de ficção contemporânea. Quando você lê ficção, você é mais atraído para a linguagem e descrição do que para o enredo?

PH: Como leitor, com certeza. Mas observação e descrição são refratadas através da personagem – para mim, o enredo é um predicado da personagem. Então, quando eu descrevo em detalhes uma paisagem ou um artefato ou qualquer outra coisa, tudo é encurtado através de um indivíduo. Nunca é apenas uma paisagem descrita em detalhes; é uma paisagem da maneira como ela é apreendida por uma mente. Particularmente quando se trata de coisas relacionadas a paisagem e alguma densidade de linguagem, um dos santos padroeiros do livro, e da maneira como escrevo, é Wallace Stevens. A maneira como ele descreve o clima – as auroras do outono e a excitação do verão; o clima e as estações do ano como ocasiões para a comunhão da mente consigo mesma; o drama de consciência. Porque A restauração das horas é tão interior, senti uma espécie de consequente necessidade de ser o mais concreto possível com a linguagem. Inclinando-se muito sobre o abstrato e o conceitual, é fácil ficar boiando. Em A restauração das horas, esse cara está, basicamente, deitado na cama pensando, então todas as cenas e coisas sobre as quais ele pensa tinham que ter correlacionadas imagens literais e concretas, mesmo que isso permaneça iminente e físico e não simplesmente se dissolva em idéia pura.

TP: Uma coisa que realmente me impressionou em A restauração das horas é que você conseguiu canalizar uma tradição que remonta a uma série de escritores do século 19, mas não há nada arcaicos sobre o estilo ou idioma. Você pode falar um pouco sobre suas influências e como você foi capaz de tornar a escrita transcendentalista soar tão contemporânea?

PH: É, talvez eu pense nisso a partir de um ângulo ligeiramente diferente, mas eu vou fundo no espírito da coisa. Eu adoro os transcendentalistas. Emerson está no topo da minha lista. Thoreau não está muito atrás. Também penso em Hawthorne, Melville... mesmo Wallace Stevens vem desse tipo de tradição. Emily Dickenson – escritores assim. Algumas pessoas realmente pensam que A restauração das horas tem uma espécie de sensação arcaica, talvez porque se passa 90 ou 100 anos atrás, e vai ainda mais para trás. Algumas dessas coisas tem a ver com o fato de que eu gosto da idéia de despir algumas das distrações mais proeminentes da cultura material atual, que eu acho que pode configurar uma espécie de véu de ruído branco – é difícil ver ou ouvir o pensamento de alguém. Além disso, eu estava muito consciente quando eu estava escrevendo sobre o perigo, isso porque eu estava fazendo aquelas coisas e tinha essas afinidades. Eu estava consciente de que poderia cair numa prosa que soasse demasiado arcaico, que, então, soaria como muito educada. Eu acho que há uma espécie de formalidade na escrita, do tipo que faz parecer arcaico, mas eu tentei intencionalmente não usar sintaxe ou dicção arcaica – exceto em alguns lugares muito deliberados, principalmente nas citações de O horologista lógico [um livro fictício de 1783 que é citado ao longo do romance]. Eu tentei usar esse contraste; a prosa no resto de A restauração das horas não parece tão arcaica, porque ela é colocada junto de coisas que são intencionalmente arcaicas. Voltando a uma pergunta anterior, quando escrevo prosa eu me vejo como escrevendo poesia. É lírico, é pastoral – eu acho que por causa do meio transcendental – mas estou indo descaradamente para um tipo de densidade máxima de linguagem, imagem e significado em cada frase, sem que haja colapso sobre si mesma e se torne empolada ou impenetrável. Eu acho que talvez se você colocar todas essas coisas juntas, e mirar no ideal de precisão e exatidão, isso impede de soar arcaico.

TP: Há uma espiritualidade tranquila no seu trabalho que eu acho que está faltando em um monte de ficção contemporânea (o seu antigo professor Marilynne Robinson é uma exceção óbvia) e eu ouvi que você é um grande leitor de teologia. Gostaria que você falasse sobre como o seu trabalho ou seu pensamento é influenciado por pessoas como Karl Barth, ou Martinho Lutero. Ou até mesmo alguém como William James?

PH: Todas as pessoas que você acabou de menciona eu acho que você pode alinhá-las numa formação de desfile militar, todos eles vem da mesma tradição – o pensamento protestante reformado. Eu cresci aqui em Boston como um tipo de ateu neutro. Eu lia meu Nietzsche e mais nada, mas eu não era um ateu dogmático – eu não era doutrinário; eu não tenho nada contra a religião. Depois de ter estudado com Marilynne Robinson por muitos anos, me ocorreu que se eu lhe perguntasse de onde vinha sua fonte estética, intelectual, sua sofisticação e integridade emocional, ela certamente me diria que era de sua religião. Ela me diria que isso vinha de sua leitura desta tradição. Dado que eu respeito muito ela, eu estaria inclinado a respeitar a sua resposta, seu próprio cálculo de si mesma. Então, eu comecei a ler essas coisas e eu achei que eles eram incrivelmente belas – profundamente preocupado com a narrativa e a cosmologia. Foi muito mais do que a sujeira popular que você vê na imprensa entre Richard Dawkins e os Criacionistas – os pequenos rascunhos sujos dessas coisas. Quanto mais profundamente eu os leio, mais eu percebo que se você se isola dessas tradições de pensamento, você está se isolando da maior parte da história intelectual ocidental, até mesmo da maioria do pensamento Pós-Segunda Guerra Mundial. É quase como um tipo de censura, como "a religião é ruim para você, não perca tempo olhando para a teologia". Eu leio alguém como Karl Barth e é o pensamento humano mais bonito e esteticamente agradável que já eu encontrei. Em A restauração das horas, já que é ficção, eu não sou obrigado a me envolver em apologética ou oferecer provas, mas eu posso explorar as coisas. Eu posso brincar com elas de forma dramática e estética, e tipo ver como essas pessoas são responsáveis ​​por si mesmos em termos de concepções espirituais de quem eles são no universo.

Se você olhar para Emerson, ele era um ministro unitarista e deixou a igreja. Como você sabe, o censo comum sobre isso é ele deixou a igreja por pastos mais verdes. Mas se você olhar de fora para a tradição de que ele veio, há um forte argumento a ser construído de que ele deixou a igreja para encontrar Deus. Essa é a tradição protestante – pelo menos o pensando e a escrita com a qual eu estou familiarizado. Há um anti-autoritarismo embutido, a presunção de que a igreja institucional é uma construção humana; isso sempre vai endurecendo, e é antitético ao pensamento verdadeiramente piedoso. Para eles, o que realmente importa, é você e escritura. Os unitaristas romperam com os calvinistas; os calvinistas romperam com os luteranos; os luteranos romperam com os católicos; os católicos romperam com os judeus; os judeus romperam com os babilônios. É uma bela tradição, e parece bem ligada nesta compreensão de perseguição religiosa e desse tipo de pensamento. Os melhores teólogos, por exemplo, Karl Barth, viam a bíblia como uma obra de literatura e isso não rebaixa a sua autoridade normativa ou santa. Ele é um leitor atento do texto. É um uso muito mais sofisticado da imaginação e do intelecto. Faz você pensar sobre o que falamos quando falamos de Deus. Quando você olha para alguém como Dawkins, ele só perverte tudo isso dizendo: "se você acredita em Deus, você acredita em um homem velho de barba branca sentado num trono". É claro que isso é ridículo. Mas aí você percebe que pessoas como Dawkins nunca leram uma palavra de teologia, eles contam com o preconceito popular – ou em todo o positivismo materialista que compreenderam mal em suas, você sabe, 101 aulas de Wittgenstein. Se tudo é feito de matéria, e não há tal coisa como o espírito, então o que tudo isso significa é que não temos idéia do que é a natureza da matéria. Estou perfeitamente disposto a admitir que tudo é feito de coisas, mas isso só significa que nós não sabemos realmente o que são as coisas. Para mim, a teologia, a poesia e a arte caminham lado a lado com a física. Essa versão do materialismo é totalmente antiquada, fora de moda, a mecânica newtoniana. Eles estão sempre reclamando que não é testável, não é falsificável, mas os mais sofisticados experimentos da mecânica quântica só fazem a natureza da matéria mais ambígua do que jamais foi antes – está tudo dependente de observador. Se você é um escritor, há uma tensão muito legal anti-realista na mecânica quântica. Influência supraluminal e dependência da realidade do observador – tudo isso fala com a natureza experimental e participativa da consciência humana. Quando traduzidos para a ficção é parte da característica. Há uma passagem em A restauração das horas onde Howard está andando pela floresta. Quando ele se vira para olhar para a sua carroça, ele tem certeza de que cada vez que vira a cabeça tudo por trás dele desaparece ou muda. De certa forma, isso é apenas brincar com a física quântica, apenas em um sentido narrativo.

TP: O New York Times mencionou que o primeiro livro que você escreveu se passa em uma mina de prata mexicana do século 16. Será que o seu próximo livro vai uma mudança radical de A restauração das horas? Ou esse é o material que você ainda está interessado em trabalhar?

PH: Tenho pronto provavelmente 75% do primeiro rascunho do próximo romance. O título dele é Enon, que é a cidade em Massachusetts em que George Crosby morre. Em sua mente, era para onde ele fugia de sua juventude no Maine. É o nome colonial original de Wenham, a cidade em que cresci, um pouco ao norte de Boston. Portanto, este próximo livro é sobre um dos netos de George. Seu nome é Charlie Crosby. Ele faz uma pequena aparição em A restauração das horas. Então, é sobre ele e sua filha, Kate. A ação é subsequente àquela de A restauração das horas. Situado no mesmo local, mas não é uma sequência em si. Como Charlie faz o seu caminho através do enredo ou das circunstâncias do romance, George vai aparecer como parte do tipo de reservatório de memórias e pontos de referência de Charlie. Mas não é uma continuação da ação de A restauração das horas. Eu tenho uma idéia de retornar com um terceiro livro ligado a mesma família, para que eu possa criar a minha própria e pequena Nova Inglaterra Yoknapatawpha um dia desses.

Esta conversa foi publicada originalmente no blog da editora Tin House em 10 de janeiro de 2011. Ela reproduzido e traduzida para o português com permissão de Tony Perez.

*Imagens: retrato de Paul Harding reprodução de Pulitzer.org e capa do livro divulgação.


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quinta-feira, 4 de agosto de 2011

TODA A FICÇÃO DA NEW YORKER

A revista New Yorker é uma das revistas mais "trendy" do planeta. Foi criada na década de 20, soube se adaptar muito bem a passagem do tempo e inventou um estilo único. Os perfis políticos, as longas reportagens, os famosos cartoons e as capas são verdadeiros marcos na história do jornalismo.

No meio de todas essas coisas, a revista ainda criou um espaço para publicar textos de ficção de autores renomados internacionalmente. Como fica difícil acompanhar tudo o que aparece nas suas 47 edições anuais alguma santa alma criou um banco de dados com toda a ficção já publicada pela revista.

É um banco de dados para a gente guardar nos favoritos!

*imagem: reprodução da capa da revista.
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POR QUE ESCRITORES NÃO DEVEM BLOGAR?

Vi no GalleyCat uma notícia curiosa e pensei em abrir algumas ideias a respeito. A notícia dizia que há duas semanas atrás a blogueira e escritora americana Livia Blackburne escreveu um longo post dizendo que escritores não deveriam se dedicar aos blogs porque "blogar é uma perda de tempo". Simplificando o post, os três principais para que os escritores abandonassem seus blogs eram:

1. Blogar é melhor para os escritores de não-ficção porque eles compartilham os seus conhecimentos com um público específico, estar ligado com o público pode ajudar as vendas.

2. "Tempo gasto no blog é tempo gasto longe de outra coisa: escrevendo outro livro, contatando um clube do livro, trabalhando meio período e investindo esse dinheiro em publicidade ou com um agente”.

3. Escritores de romances blogam muitas vezes se concentram na arte de escrever ao invés de se concentram em seus próprios leitores, criando "uma conferência escrita interminável". Enquanto isso ajuda a "encontrar novos amigos, desenvolvimento profissional e aprendizagem do seu ofício", não significa necessariamente aumentar as vendas de livros.
Logo depois ela escreveu um outro post dizendo que embora blogar seja perda de tempo, John Locke (aquele que vendeu 1 milhão de livros no Kindle em cinco meses) achou um caminho certo para aumentar suas vendas.

É certo que o post e as ideias giram muito em torno do mercado editorial americano. No entanto, se pensarmos no mercado editorial brasileiro acho que a Livia Blackburne vai ter razão. A internet realmente facilitou a divulgação e circulação de novos escritores, mas isso não significa que ela mudou a maneira como fazemos e pensamos o universo literário.

Um caso brasileiro
No final dos anos 90 e começo dos anos 2000 alguns dos nossos escritores ficaram conhecidos por meio da internet. O blog foi uma ferramenta fundamental para mostrar o trabalho de gente que estava escrevendo, mas que ainda não tinha alcançado reconhecimento mais amplo. Só que essa "geração" de escritores conseguiu publicar livros impressos e deixou da internet um pouco de lado. De modo que é raro ver novos escritores publicando ficção em blogs. Quase não se vê.

Não que o blog (e a internet) tenha perdido importância para a literatura. Pelo contrário, os blogs junto com as redes sociais ocupam o lugar da divulgação, do debate de ideias, das resenhas, das informações sobre um escritor, da reunião de leitores, das agendas de feiras, festas etc. Pode ser que antes da Livia Blackburne a gente já tivesse percebido que como escritores era mais importante se dedicar ao trabalho do que ao blog.

Pegando um caso mais brasileiro, Daniel Galera e Joca Reiners Terron falaram sobre o blog como ferramenta para escritores na reportagem Internet não anula estratégias de marketing, do jornal Gazeta do Povo. O pensamento dos dois sintetiza bastante coisa. Na reportagem Galera resume o caso da seguinte forma:
“A internet se firmou como um grande catalisador das relações entre
autores, leitores e críticos, e não como um novo meio para publicação de
literatura. A discussão literária da internet ainda se dá em torno de livros
impressos”.
E o Joca disse o seguinte:
Terron, que concorda que a rede serve mais para reunir os interessados em literatura, acredita que as grandes editoras ainda detêm o “selinho ISO 9000 de qualidade literária”.
Expandindo um pouco mais a fala dos dois, é possível dizer que de fato o grande número de discussões que rolam na internet gira em torno dos livros impressos e a internet por si só não parece capaz de legitimar alguém como escritor. O livro impresso é a verdadeira confirmação de que aquela pessoa exerce aquele ofício. Pensando dessa forma fica difícil imaginar a existência de um tipo de literatura que seja da internet. Por isso faz mais sentido usar a internet como meio de divulgação do trabalho do que formatação do trabalho em si.

Outro exemplo bacana foi a antologia ENTER, organizada pela Heloísa Buarque de Hollanda e pensada para o mundo virtual. A antologia não pretendia mostrar escritores que eram apenas da internet, mas mostrar a internet como potencia de visibilidade e acessibilidade da literatura. Tanto que a maioria dos 37 escritores que participaram tinham um pé fincado no mundo impresso. E gosto de falar desse caso porque existe um comentário da Heloísa que deixa bem claro a relação entre internet e produção de ficção:
"Não existe uma literatura de internet, mas, sim, práticas literárias na rede, que são diversificadas. E a antologia mostra que o que expandiu foi a palavra. Não foi a literatura do ponto de vista tradicional e canônico. Essa que preza a qualidade e a autoridade continua, e também hospedada na internet”.
Depois dessas longas explicações gostaria de abrir uma discussão em torno dessas ideias. Será mesmo que para um novo escritor blogar é perda de tempo? Será que existem escritores na internet? Será que existem escritores ou grupos de escritores que fazem da internet o seu laboratório de criação?

*imagem: reprodução Diary of the book-lover.

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terça-feira, 2 de agosto de 2011

GANHADORES PRÊMIO SP DE LITERATURA

Método prático da guerrilha, de Marcelo Ferroni foi o ganhador do Prêmio SP de Literatura na categoria Livro do ano - autor estreante. A disputa não deve ter sido fácil, pois ele concorria com outros autores de enorme talento. Mas o prêmio é merecido já que o Marcelo quebra a ficção (o gênero romance) e brinca com seus pedacinhos. O livro tem um jogo entre o real e o fictício que começa desde a capa (o nome também causa uma certa confusão).

Para quem quiser saber mais sobre Método prático da guerrilha, separei três entrevistas com o autor: uma feita por Isabel Coutinho para o jornal Público (de Portugal); outra feita por Márcio Vassallo para a Agência Riff; e a última feita Rogério Pereira para o jornal Rascunho.

Quem quiser, pode ler um trecho do livro aqui.

***

Passageiro do fim do dia, de Rubens Figueiredo ficou com o prêmio da categoria Melhor livro do ano. Rubens é bastante conhecido pelas traduções de Paul Auster, Raymond Carver, Liev Tolstói, Philip Roth e tanto outros (só gente grande!), mas já publicou outros sete livros antes desse.

A jornalista Mona Dorf entrevistou Rubens Figueiredo logo depois do prêmio. Também tem entrevista dele para o caderno Prosa & Verso falando sobre o livro, o prêmio e outras coisas mais.

Quem quiser, pode ler um trecho do livro aqui.

*imagem: reprodução blog da Companhia das Letras.

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CAPA FETICHE

É um clichê dizer que a gente compra livros por causa da capa. Mas a verdade precisa ser dita: uma capa bonita causa um inevitável desejo de compra. Não conheço ninguém que nunca tenha comprado um livro por causa da capa - ao menos uma vez na vida. Concordo com o Peter Mendelsund quando ele diz que a capa de um livro é a cara (o rosto) dele. É como ele se apresenta pra gente.

Num mundo em que o livro impresso tem sua morte anunciado, projetos gráficos mais orgânicos ganharam uma importância nunca vista antes.

Acho que rola a mesma coisa com capa de revista, de disco (ainda existem discos?) e primeira página de jornal. Olhando nas bancas percebi uma tendência nas revistas de criar capas diferentes para a mesma edição - quem não lembra daquela capa múltipla da revista Superinteressante ou mesmo das três capas da revista Serrote.

Daí li na Coluna de Babel (da Raquel Cozer) uma notícia que parece pegar carona nessa ideia: a Editora 34 lança em agosto uma edição do romance O duplo, de Dostoievski com três versões de capa. O objetivo foi destacar "as ilustrações do expressionista austríaco Alfred Kubin – 26 delas foram publicadas originalmente na edição alemã de 1933 e são agora reproduzidas no interior da edição".

Capas diferentes para um mesmo livro já tinham aparecido no Brasil para a famosa série de entrevistas da revista Paris Review - que saiu aqui pela Companhia das Letras. Na primeira edição as capas foram personalizadas por Marco Mariutti e Clovis França. Já a nova edição (que foi lançada esse ano) ganhou projeto ultratecnológico assinado por Flávia Castanheira. Nenhuma capa desse livro é igual a outra - coisa impressionante!


Para finalizar, descobri num post do Almir de Freitas que a editora Vintage Books está lançando novas edições de livros de Oliver Sacks. O projeto gráfico ficou a cargo de Cardon Webb - um designer descolado de Nova York. O detalhe mais impressioante é que as diferentes imagens de capa das seis edições em conjunto formam uma única figura. Como se fosse um quebra-cabeça enorme. Aqui acontece o inverso dos casos que citei antes, a capa foi pensada como um conjunto, uma coleção.

Pensando aqui com meus botões, acho que a ideia não foi inventada agora. Certamente deve haver outros exemplos de gente que criou essas capas seriais antes - alguém se lembra de algum (escreve aqui nos comentários que eu faço uma atualização depois)? Agora fico me perguntando se isso pode virar tendências nas capas das edições brasileiras. Evidentemente é um recurso que precisa ser usado com cautela e em ocasiões especiais. Em demasia pode cansar.

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Atualização: uma pessoa anônima e o Mauro Siqueira lembraram da série de capas para a coleção Crônicas Saxônicas, de Bernard Cornwell. O Samir Machado conta mais coisas sobre essas capas no blog Sobrecapas. Abaixo a imagem:

Alguém lembra de mais alguma?

*imagens: reprodução.

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